Baixe aqui o trabalho defendido em 2019 com a presença de Edileuza Penha de Souza e Ana Flávia Magalhães Pinto na banca. RESUMO:…
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O segundo porto a mais receber africanos desde século XVI tem nos terreiros de candomblé um manancial inter-étnico entre jejês-fon, nagôs, congo-angolas e os seus herdeiros nascidos no Brasil.
Nas ruas tal legado se perpetua em sons e imagens que culminavam nos blocos de carnaval como a Embaixada Africana que no ano de 1897 homenageou o rei Etíope Menelik II logo após vencer a guerra contra a Itália.
Salvador viveu um boom populacional permeado em disputas por um pedaço de terra que culminam na reforma urbana na véspera do Natal de 1968, realizada pelo prefeito biônico, Antônio Carlos Magalhães (ACM).
O secular Centro é deixado de lado para o capital imobiliário de aliados e familiares se expandirem na direção do litoral norte com largas e inóspitas avenidas acompanhadas pelo Centro Administrativo da Bahia (CAB) e a nova Rodoviária.
É a expansão dos prédios, condomínios e casas comerciais muradas, na apoteose do shopping Iguatemi, inaugurado em 1976.
É lá depois no Shopping Barra (1987), que irrompe um novo ciclo do comércio, e das salas de exibição.
O Anjo Negro (1972) é uma produção baiana a qual Mário Gusmão interpreta Calunga, um nome de origem kicongo comum na Umbanda para nomear seres espirituais que vibram na linha de Iemanjá, como o Marujo.
O personagem também faz referências a Exu para levar o caos ao cotidiano de uma família aristocrática cheia de traumas, demagogias e repressões, confundindo-o com o Diabo cristão na sua função negativa de inversão ao ponto da transgressão sexual de Calunga ter na mestiçagem o pecado e a tragédia.
Além do roteiro, a história é uma metáfora da vida de Mário, que adentrou as elites e as sacudiu sem fugir de uma vida marcada até a sua morte pela pobreza material e um prestígio cínico que o levou a ser preso como usuário e traficante em 1973, e passar 56 dias na prisão, ao contrário dos amigos brancos que estavam ao seu lado.
Saída de Juazeiro, Lindinalva foi estudar na capital, Salvador.
Na década Lindinalva 1970 inicia o curso de jornalismo na UFBA sob forte influência da tríade.
Vence um concurso de roteiro e dirigi Um Jegue na Paisagem Nordestina (1974)
O documentário se passa na região de Senhor do Bonfim onde o jegue é um membro da família.
Porém, uma fábrica se finca para abater e exportar as carnes do animal.
A narrativa a leva ao prêmio Humberto Mauro na Jornada Nordestina de curtas-metragens em 1974.
Porém ela não segue adiante devido os traumas com as situações de violência que viveu.
As imagens de Salvador e Recôncavo constituíram-se base da produção da nova hegemônica Rede Globo.
Roteiros e personagens vindos de filmes ou obras de Jorge Amado e Dias Gomes traziam uma leitura a qual convergiam com as perspectivas industriais da TV.
O Bem Amado, de 1973; Dona Flor e seus Dois Maridos, e até mesmo o longa Tenda dos Milagres dá uma ênfase desnecessária ao personagem de Hugo Carvana, e sua neurose sexual com “mulatas”.
Dessa forma, personagens negros eram muitas vezes secundários, e ainda assim conquistavam o público.
É uma era com Ruth de Souza, Milton Gonçalves, Juarez Paraíso, Jards Macalé e Chica Xavier nas telas.
Também era proporcionalmente avançado como em Tenda dos Milagres Nelson Pereira denunciou o racismo e instigou reflexões de violência das relações inter-raciais nas comunidades de terreiro.
Nos cinemas de bairro o preço do ingresso era acessível, cercados por tabuleiros de acarajé, carrinhos ou bancas de quitutes que faziam parte do cenário das crianças, jovens e adultos até tarde da noite.
Mas o declínio é célere nestes tempos, fecham as salas em Itapagipe, Bonfim, São Caetano e Liberdade.
Os que restam voltam a se concentrar no centro e passam por ameaças de incêndio, mosquitos, e deficiências nos ar condicionado e na projeção.
Nem mesmo o tradicional e outrora elitista Cine Guarany escapa à tendência.
Na programação os filmes de artes marciais, as pornochanchadas e o pornô geram uma campanha contra o que é denominado “enlatado”.
Agnaldo “Siri” Azevedo era um farmacêutico frequentador do Clube de Cinema e da vida boêmia até embarcar na direção de produção de Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964) do amigo Glauber Rocha.
O sete foi um caminho sem volta, até que resolveu dirigir os seus próprios filmes ao sair do Rio de Janeiro e retornar para Salvador.
O primeiro é o curta Dança Negra (1969). Nos anos 1970 imprime a sua marca com exibições constantes nas Jornadas de Cinema com Boca do Inferno (1974); Phylarmônicas (1975); Carbonado ou xique-xique de Andaraí: a cidade fantasma (1976).
Também é peça chave nos debates sobre as políticas e concepções do cinema, pois foi fundador da Associação Baiana de Documentaristas (ABD); crítico à influência do sudeste e dos financiadores nas Jornadas; e está na linha de frente nos conflitos com a geração superoitista.
O Clube de Cinema da Bahia foi fundado em 1950 sob liderança de Walter da Silveira. Nas sessões era possível ver e discutir obras vindas da França, Japão, EUA e em especial do neorrealismo italiano que influencia à crítica às representações de Carmem Miranda.
Já a influência marxista busca visão total sobre a cadeia que leva Walter a identificar o modelo de distribuição hollywoodiano, e a cumplicidade do parque exibidor e da imprensa nacional.
Todavia, a concepção elitista de Walter também culpa os conterrâneos por permitirem a transformação da sétima arte em mero passatempo de iletrados afeitos ao cômico grosseiro, o melodrama vulgar, e ao erótico amoral.
No fim da década de 1950 Roque era viciado em filmes de faroeste e nadar com seu cachorro, na Península de Itapagipe.
De repente Roque faz a máquina girar nos primeiros longas-metragens filmados na Bahia.
Roque está na equipe dos primeiros longas-metragens filmados por gente da sua terra.
E seguiu a secular tradição do sindicalismo de Salvador, e lutou para que técnicos como ele se sentarem na mesma mesa.
Roque também ousou fazer seus próprios filmes, e, tornou-se um guardião da memória.
Antônio Sampaio nasceu no dia 13 de julho de 1939 em um sobrado do Pelourinho. Filho da mãe solo Maria da Natividade, que o colocou em um colégio interno para acalmar a alma das ruas de capoeiras.
A arte de interpretar ganha força ao passar no teste para Bahia de Todos os Santos (1960) de Trigueirinho Neto. O seu personagem, Pitanga, é um morador do Pelô que se envolve desde furtos na zona portuária até as lutas do irmão Pedro, um estivador e líder sindical que deflagra uma greve na ditadura do Estado Novo.
O filme é atípico na abordagem dos conflitos raciais ao desfazer as fronteiras do colorismo e expor a farsa do convívio amistoso entre as raças, que levou a ter a participação em festivais internacionais bloqueada pelo governo.
Palma Neto e Alvaro Queiroz são feirantes que lideram a produção que busca contar a sua própria história. Assim tecem um argumento, arrecadam dinheiro e contratam Alex Vianny para dirigir o primeiro filme baiano colorido.
Na trama os feirantes enfrentam o exército para demover uma draga que impediria o atracamento dos saveiros, e logo depois um incêndio se alastra nas construções de madeira e taipa.
Só que a obra foi um fracasso: o diretor entrou com processo de direitos autorais contrário às modificações na montagem final. Saiu do circuito enquanto os cartazes e a programação dos cinemas no país a esperavam.
Coincidência, ou não, naqueles mesmos dias as baionetas se prostravam para a ditadura militar. E, a feira de Água de Meninos é consumida por um fogo criminoso ateado pela petrolífera Esso.
Um recado do destino para aqueles que pretendiam ter autonomia com a venda de produtos na feira, ou fazer e comercializar os seus filmes às salas de cinema.
O alvoraço se fez na cidade quando a feira de Água de Meninos tornar-se o centro dos acontecimentos narrados por Cuíca de Santo Amaro.
Também é incomum para a plateia uma mulher negra se impor na personagem Maria da Feira, interpretada pela gaúcha Luiza Maranhão.
O seu papel tem como meios de sobrevivência a prostituição, a extorsão, o furto, e o estilete marcados por um jogo de contrários com uma dondoca infeliz e pura, Ely (Helena Ignês).
Mas atriz e personagem desnorteiam o olhar opositivo para também tornarem-se símbolo de moda, liberdade, maternidade, justiça e martírio.
Também há presença de muitos cantos da cidade e Riachão puxando a gafieira no Cabaré do Zazá.
O resultado é que A Grande Feira (PIRES, 1961) torna-se a obra de maior rentabilidade na história das salas da capital baiana, o suficiente para arcas com os custos da produção.
Barravento (1962) foi concebido e iniciou as filmagens com Luiz Paulino na direção, porém no transcorrer Glauber Rocha assumiu o posto e não repartiu os créditos com o aval de Rex Schindler.
As análises apontam que a narrativa trata o legado africano como atraso e alienação, mas também reconhecem uma cosmovisão africana irrompendo os sons e imagens.
A consultoria foi do artista plástico e Assobá Hélio de Oliveira, afilhado de Procópio do Ogunjá.
Fora ele, os créditos identificam Dona Hilda, e um “destaque” para Dona Zezé, Adinorá, Armon e Sabá como cantores, dançarinos e instrumentistas regidos nos sambas por Washigton Bruno, o Mestre Canjiquinha.
A obra também marca a estreia da canção “Diplomacia” de Batatinha, na voz de Antônio Sampaio, Pitanga.
O Pagador de Promessa (DUARTE, 1961) é baseado no texto do dramaturgo baiano Dias Gomes e aborda uma cidade permeada por intolerância à religiosidade de origem africana.
Ele se inspirou em pessoas do dia a dia como o cordelista Cuíca de Santo Amaro, interpretado por Roberto Ferreira; nas mulheres candomblecistas, lideradas pela personagem de Maria Conceição; e nos capoeiras e sambistas regidos por Mestre Canjiquinha e encorajados pelo jovem ator Antônio Sampaio.
O resultado foi o maior prêmio até hoje recebido por um filme brasileiro entre os principais festivais do mundo, a Palma de Ouro em Cannes.
Luiz Paulino dos Santos era um jovem com origens afro-indígenas nascido no Pelourinho quando finalizou o curta documental Um dia na Rampa (1960) com um coletivo de produtores.
Um drible em um cenário o qual realizar se relaciona com o acesso às fontes familiares e influência no poder público.
A obra é um marco do Ciclo Baiano, definido por André Setaro como um período efervescente entre Redenção (1959), de Roberto Pires, e o Grito da Terra (1965), de Olney São Paulo.
No bojo inclui-se a Escola Baiana, marcada por realizadores e obras em “função da cultura local, o registro da baianidade numa perspectiva de imprimir no celuloide o “espírito de brasilidade”, via Bahia, sua terra e seu povo” (SETARO, 2010, p. 47).
Na trilha sonora não há identificação das gravações, mas sabe-se que o mestre de capoeira Bugalho aparece e toca seu berimbau, e que a melodia da canção final se parece com “Mas, que nada” de Jorge Ben, gravada só em 1963.
O parque exibidor entre os 1950 e 1960 seguiu a tendência nacional com inaugurações e reformas para instalar o ar-condicionado e imagens coloridas.
À frente da rede de exibição tens um herdeiro da aristocracia articulado com a igreja católica, Francisco Catharino Pithon.
Assim, novas salas aparecem no Engenho Velho de Brotas, Liberdade, Uruguai e na Cidade Nova, onde o Cinema Mercúrio tinha capacidade para 580 pessoas.
Já no secular centro o Cine Guarany, o Tupy, o Jandaia, o Pax e o Cine Popular têm setores ou horários mais baratos para muitos corpos negros que residiam por ali, nos arredores ou nas linhas dos bondes que desaguavam.
O reitorado de Edgard Santos (1946-1952) na nova Universidade da Bahia conta com a presença de diretores vindos da Europa e EUA nas Escolas de Teatro, Dança, Música e Belas Artes.
O cinema de fruição popular fica de fora, bem como os intelectuais negros da cidade, inclusive Edison Carneiro, que tem o seu projeto de Instituto Afro-Brasileiro substituído pelo Centro de Estudos Afro-Asiáticos (CEAO).
Também são raros os estudantes como Mário Gusmão, o primeiro homem negro egresso em Teatro somente 1958.
As canções praieiras de Dorival Caymmi rodavam o mundo e se encontram nas lentes de Alexandre Robatto em Entre o Mar o Tendal (1952) e Xaréu (1954) filmados nas praias de Chêga-nêgo (Jardim dos Namorados) e Carimbamba (Jaguaribe).
Já os lendários capoeiras saem das ruas e vão para um teatro em Vadiação (1954), com a trilha sonora de Mestre Bimba, e a presença de outros Mestres como Caiçara, Waldemar da Liberdade, Curió, Traíra, Nagé , Crispim (filho de Bimba) e Bugalho.
Documentários pioneiros que marcam as representações da Bahia que viriam a circular nas telas do Mundo.
O jovem Milton Santos cartografa o dinâmico centro de Salvador em 1957, o qual no fim da tarde havia retomada de “certa animação durante a entrada de saída dos cinemas”.
No Pelourinho os cortiços eram habitados por uma maioria feminina voltada ao emprego doméstico em troca de alimentação. Já os homens tinham à disposição os biscates, a atividade braçal no porto, e alguns emprego em posições baixas no comércio ou na indústria.
No mesmo perímetro, o geógrafo encontrou outros endossos sobre o perfil social da época, com muitas pessoas oriundas de zonas rurais, com baixa escolaridade e relativa frequência às salas de cinema – média de uma vez por semana.
Após a descoberta do petróleo em Salvador no ano de 1939, um novo ciclo econômico no Recôncavo se instala com a inauguração da Refinaria Landulfo Alves em Mataripe em 1950.
Os herdeiros da economia escravista reproduzem-se no tabaco, cacau, indústria têxtil e de bebidas. E o comércio concentram-se nas mãos de judeus, espanhóis, ingleses, alemães ou árabes.
A roda é movimentada nos anos 1950 por uma força de trabalho autodeclarada negra (71,7%), permeada por rendas salariais mais baixas, mesmo na indústria do petróleo, e altas taxas de analfabetismo: 84% entre pretos e 76% entre pardos.
Na leitura de Luiza Bairros (1988) tal quadro distancia os fazedores da cultura, a população negra, da produção gerada por suas simbologias.
GECAP na minissérie O Pagador de Promessas (1989).
Tenda dos Milagres é uma minissérie brasileira apresentada pela Rede Globo em 30 capítulos em 1985.
As gravações foram concentradas em Salvador e Cachoeira.
No elenco um estrelato de atores e atrizes negras com pouco espaço nas novelas da época.
Tânia Alves – Ana Mercedes
Nelson Xavier – Pedro Archanjo
Milton Gonçalves – Mestre Lídio Corró
Dhu Moraes – Rosa de Oxalá
Chica Xavier – Magé Bassã
Antônio Pompeo – Budião
Solange Couto – Sabina de Iansã
Antônio Pitanga – Exu
Tony Tornado – Zé Alma Grande
Dill Costa – Miquelina
Iléa Ferraz – Ivone
Por volta de 1976 Luiz Orlando já estava no Clube de Cinema.
No fim de 1980 ele é chamado para trabalhar, e propõe e executa as oficinas de projeção na Fundação Cultural do Estado da Bahia (Funceb) nos bairros de Alagados, Liberdade, Cabula, e Nordeste de Amaralina.
O relatório da Funceb de 1982 identifica mais de 50 cineclubes ou pontos de exibição, com 88 mil presentes.
É a primeira vez que Luiz leva uma delegação deste “cineclube periférico” para as Jornadas do Conselho Nacional de Cineclubes, em Piracicaba-SP.
No ano de 1994 já inauguração na Casa do Benin da videoteca da Associação Brasileira de Vídeo Popular (ABVP) a qual Luiz é o representante regional.
O CECUP, Centro de Culturas Populares, então coordenado por Normando tem papel de auxiliar na disseminação de vídeos e videotecas em escolas, organizações sociais e culturais e universidades.
Nos anos 80 o vídeo analógico traz esperanças de novas experiências.
Assim, na cara e na coragem Olavo abre a Portfolium para colocar imagens em movimento em Paixão e Guerra no Sertão de Canudos.
Um dos raros longa-metragens produzidos no início dos anos 1990.
Uma produção atípica que misturava sua caminhada como fotografo e apoio de redes oriundas da resistência à ditadura militar.
Uma obra que rodou o Brasil e o mundo com plateias até hoje intangíveis.
O Bando de Teatro Olodum já apontava para uma nova representação e produção negra no palco.
Mas quando o assunto era televisão ou cinema a coisa era mais restrita.
E assim Lázaro Ramos e Fábio Vidal iniciaram o trabalho nas câmeras em Cinderela Baiana (1998), com Carla Perez.
Um clássico trash do axé.
Já a Tv Bahia fez um movimento raro e pontual, investiu na minissérie Danana de Sabiada (1998), baseada em obra de Joâo Ubaldo Ribeiro.
Filhote da ditadura militar, Antônio Carlos Magalhães assumiu o controle da filiada da quase monopolista Globo, a Tv Bahia.
Noticiário e cultura mesclam a venda da indústria do axe music, permeada de paternalismo, e autoritarismo às vocês dissonantes, nas artes, e na política.
Na construção desse discursos novas agências de publicidade e produtoras se especializaram no marketing político que tornou a Bahia um celeiro nacional durante duas décadas.
Salvador chega há mais de 1,5 milhão de habitantes.
Condomínios fechados, automóveis individuais para as elites, e uma poluição das águas que exalava nos rios e praias.
Os poucos cinemas de rua estão cada vez voltados para ao pornô e encontros casuais entre homossexuais.
É o shopping que leva a classe média para consumir e idealizar Hollywood fora da TV.
Enquanto isso, a maioria oriunda de invasões, ocupações, baixadas… Viviam toda a sorte de deficiência.
A velha Bahia, que buscava uma mestiçagem hipócrita entre o moderno europeu, o barroco e o africano, se mostra cada vez mais frágil, conforme Agnaldo Siri Azevedo denuncia em Capeta Carybé (1999), um pouco antes de sua partida para o Órun.
Nas fronteiras do Pelô está o Palácio Tomé Souza, sede da prefeitura municipal que tem, entre os posicionados na corrida eleitoral de 1988, Gilberto Gil.
Não chega a ser alguém com atuação alinhada com movimentos negros na época, era filiado à teoria neofreyriana sincrética de Antôno Risério, mas era ícone com seu corpo e canções que partiam de uma identidade que mistura consciência política africanização.
Marcas que vinham no álbum Refavela (1977), gravado após a sua participação no 2º Festival Mundial de Arte e Cultura Negra (FESTAC 77) em Lagos, na Nigéria.
O sonho de virar prefeito é abandonado, porque Gil descartado pelas lideranças democráticas, ainda assim, não desiste da política, torna-se o vereador mais votado no pleito de 1989.
Também não desiste de ampliar os voos comerciais.
Assim, assina as trilhas sonoras de Corações a Mil (1983), Jubiabá (1987) e Quilombos (1988).
Deoscoredes Maximiliano dos Santos, o Mestre Didi Asipá (1917-2013), é de uma família originária do império Iorubá.
Na cidade de Salvador, os Asipás reconstruíram-se por meio de alianças com outras famílias africanas primordialmente, fundando terreiros de candomblé chaves na perpetuação deste legado civilizatório.
No ano de 1974, o território de Mestre Didi se expande ao fundar a “Sociedade de Estudos da Cultura Negra” (SECNEB), responsável por publicações acadêmicas e produções culturais, entre as quais o cinema, com a realização de três documentários: Orixá Ninu Ilê: Arte sacra negra I (ELBEIN, 1979); IyáOrixá Ninu Ilê: Arte sacra negra I-mi Agbá – Mito e metamorfose das mães nagô: arte sacra negra II (ELBEIN, 1981); e Egungun (BRASJBLAT, 1982).
A inserção na linguagem cinematográfica vai além nas ações coordenadas por Didi, com a criação de um cineclube com viés educativo no espaço Obá Biyi por Luiz Orlando, o fomento a artigos como “O negro e a abolição” de Orlando Senna (1979), e um seminário destacado na revista Filme e Cultura da Embrafilme (1982).
Nesse evento, demarca-se, e por vezes, antecipa-se concepções de artistas, intelectuais e militantes negros, como Muniz Sodré, Beatriz Nascimento, Antônio Pitanga, Ruth de Souza, Grande Otelo, Odilon Lopez e outros, quanto às narrativas e políticas do cinema negro e nacional.
OS blocos afro, afoxés e ijexás explodem no inicio dos anos 1980.
Depois do surgimento Ilê (1974), veio o Badauê 1978), Olodum (1979), Malê de Balê (1979), Muzenza (1981), Os Negôes (1982)… e dezenas ainda a serem registrados.
Também haviam os punks, o brigões, as gangues juvenis sem a violência dos dias de hoje.
Mais forte eram as associações de bairro, a Federação de Associação de Bairros (FABS), era a maior.
Mas no Calabar e Alto das Pombas tinha uma autonomia e associação própria.
Dançar e se movimentar pela cidade para trabalhar e estudar é acompanhado por conflitos policiais e abusos nos preços dos transporte.
Daí que no ano de 1981 o Quebra-quebra abalou não só a cidade, como a ditadura militar no Brasil.
A websérie Cinema de Terreiro chega ao oitavo episódio abordando a Retomada do Cinema Baiano na voz de três jovens da década de 1990: Ceci Alves, Maoma Faria, e Alder Paz, o Kibe.
Eles narram como os seus pais influenciaram a contar histórias, a ser um operário da imagem, e a viver dentro das salas de cinema.
Assim, se conectaram às gerações que enfrentavam a instabilidade da produção desde década de 1960, aprofundada com o fim da Embrafilme.
Os três estão entre os poucos em um cenário de mais prestígio do que dinheiro, concentrado no mercado publicitário.
Tempo de distinções entre o técnico e o artístico, o vídeo e a película, as políticas públicas e a das empresas.
Um panorama de futuro incerto envolvido por organização política e muitos sonhos que os tornaram referências profissionais no estado, com trânsito no Brasil e no mundo.
Os mecanismos de isenção fiscal tornam-se horizonte no fomento, conjugados com o apoio de estruturas como a DIMAS, a Diretoria do Cinema e Audiovisual da Fundação Cultural, que era um centro de empréstimo de equipamentos, algum recurso para produção e gestão da sala Walter da Silveira.
É por lá, ao redor da Biblioteca Central no Barris, que a Associação Baiana de Cinema e Vídeo (ABCV) surge em 1999 para reanimar a mobilização por avanços.
A websérie Cinema de Terreiro chega ao 9º episódio com os depoimentos de Lindiwe Aguiar, Iris de Oliveira, e João Tatu.
Os três são adolescentes das periferias urbanas na década de 1990, que têm na escola e nas Ong´s os caminhos para chegar até a produção em vídeo.
Lindiwe vive o pioneirismo no secular Liceu de Artes e Ofícios, até virar educadora na Fundação Cidade Mãe.
Ela se inspira no salão de beleza da mãe para abrir a produtora Ogunjá Filmes, e questiona o rótulo de alternativo.
Já Iris Oliveira sai de Itapuã para virar aprendiz na Cipó no fim da década de 90.
Rogério Santos era um cinéfilo que se mete com a fotografia no Arquivo Zumví e o movimento negro desde fim dos anos 1970.
Começa a filmar com uma com uma câmera própria até roteirizar e dirigir obras para tv´s comunitárias em Belo Horizonte a partir da ABVP.
Só que as políticas e o mercado do audiovisual não tinham olhos voltados para este largo.
Luiz Orlando e Antônio Olavo assumem o projeto de direção do documentário Bob Marley: um coração rastafári na Bahia.
A produtora Portfolium lançam uma campanha com shows solicitações de financiamento público e privado.
Mas ao final os recursos não vieram.
No dia 17 de junho de 1984, às 9h, Luiz Orlando inicia os trabalhos do II Encontro Baiano de Cineclubes com a
finalidade criar a Federação Baiana de Cineclubes (FBC).
Na ata assinada por Maria do Carmo Santos Sales, do Cineclube Comunitário na Nova Divinéia, os trabalhos são divididos em três partes: I) Relação dos cineclubes com a sociedade; II) Plano de ação; III) Eleição da diretoria.
No momento final duas chapas foram inscritas: Mutirão e Já Ganhou.
Dos 152 presentes, 22 cineclubes estão aptos a votar e escolhem a
Mutirão por 18 votos, composta por Luiz Orlando (presidente), Jaime Sodré (vice-presidente), Antônio Jorge Cury (1º secretário), Serafina Maria de Santana (1º secretária), Antônio Raimundo Batista da Costa (tesoureiro).
Na Jornada Brasileira de Curta Metragem de 1977 o curta Alma no Olho de Zózimo Bulbul ganhou o Prêmio Embrafilme Trófeu Humberto Mauro.
Naquela era era raro filmes por dirigidos por pessoas negras, mais ainda quando se cruzam com as concepções do movimento negro no Brasil e no mundo.
Zózimo foi um deles, ao escrever e roteirizar Alma no Olho.
Mas Pitanga foi audaz ao procurar dirigir um longa-metragem de ficção.
As suas primeiras propostas de roteiro não foram aceitas pelo mercado, entre as quais uma adaptação de Clara dos Anjos de Lima Barrato.
Restou a ele então se associar com Cacá Diegues e suas concepções de um Brasil mestiço, enquanto o homem negro na obra tem as cinzas como destino, no meio de relações o inter-raciais e paradoxalmente desracizalizada que o animalizam e o emasculam.
A tríade do cinema baiano é formada pelo Clube de Cinema, o Grupo Experimental de Cinema (GEC) da UFBA, fundado em 1968, e as Jornadas de Cinema, iniciadas em 1972.
No ano de 1974 o GEC realiza a II Mostra Internacional do Filme Etnográfico – O Negro¹ com uma programação permeada por menções à África.
Dois deles são de diretores negros;
Ritmos e imagens: 1º festival mundial de arte negra do Dakar (1967)², do estadunidense Willian Greaves;
E Grand magal a Touba (1961), dirigido pelo senegalês Blaise Senghor sobre a peregrinação da irmandade Mouride.
Na Mostra também há artistas e ativistas como narradores em O congo, por Julian Bond, e em A costa dos escravos(1971), na voz de Maya Angelou.
Os demais, abordam temas como Escravidão do século vinte (1971) e o apartheid na África do Sul, além dos documentários de Jean Rouch.
A tradição de ressignificar as narrativas nas ruas encontrou nos blocos de índio o seu apogeu nos anos 1970: Apaches do Tororó, Caciques do Garcia, Comanches do Pelourinho, Navajos, Sioux, Peles Vermelhas, Cheyenes, Nuvens Negras e Moicanos.
Nos filmes de faroeste os povos originários costumam ser selvagens a serem civilizados e abatidos, mas nos batuques que invadiam o Centro era mais difícil controlar a narrativa.
O medo das elites em ver a alegria de gente que trabalhava o ano todo e também na folia nos cordões e nos desfiles das escolas de samba, se traduz em violência 1977, quando a polícia persegue na avenida o maior, o Apaches.
Em 1930 o número de salas de exibição ficou relativamente baixo, oito, em sintonia com o mercado nacional, pois as legendas excluíram os analfabetos, e os novos equipamentos fragilizaram os pequenos empresários.
Mas no decorrer da década houve uma sinalização acima da média no país com reformas e adaptações que culminaram com o marco de um milhão e meio de espectadores nas 14 casas em 1940.
O novo Jandaia (1934) na Baixa do Sapateiros tinha capacidade para 2200 pessoas em quatro andares de concreto armado, revestidos por mármores e vitraux importados. Um luxo que não abriu mão das gerais para acesso aos “lixeiros, baleiros, sorveteiros, desocupados e até estudantes” (LEAL; LEAL FILHO, 2015. p. 52),
Um sinal que os homens negros continuavam a frequentar as salas, enquanto as suas filhas, irmãs, esposas ou mães se distanciam do hábito que inspirou as melindrosas.
No II Congresso Afro-brasileiro realizado em Salvador no ano de 1937, babalaôs, yalorixás e capoeiras sentam na mesa e abrem as suas rodas e terreiros, enquanto a cidade torna-se o locus de um paraíso onde o racismo é residual e a mestiçagem um destino.
Um mito lastreado na dissimulação, que delega status civil equânime às raças, e ao mesmo tempo, traduz as hierarquias do racismo científico nas suas formas culturais, folclorizadas.
Mais, condiciona a liberdade à desigualdade crescente em questões essenciais, como educação, política, trabalho, acesso à justiça, e o controle das indústrias culturais.
A Igreja Católica encontra no cinema uma forma de arrecadar dinheiro e moldar os costumes. Inaugura no ano 1932 a Casa Santo Antônio, o Cine Excelsior na Praça da Sé em 1935 e, no ano de 1937 a União Operária de São Francisco na Piedade.
Havia sintonia com o Vaticano, que estimula lideranças nos EUA para interceder nas narrativas que transgrediam a moral cristã. Já no Rio de Janeiro cruzam a censura e o incentivo à produção com o recorte educacional.
O ímpeto baiano foi arrefecido quando o responsável por coordenar as ações, o Frei Hildebrando Kruthaups, passou a ser perseguido por causa de sua nacionalidade alemã durante a II Guerra. Todavia a sua parceira Irmã Dulce deu continuidade na inauguração do Cine Roma em 1948, integrado ao Círculo Operário.
A Frente Negra Brasileira na sua passagem por Salvador, entre 1932 e 1933, aglutinou comícios com 3 mil pessoas, além de ações como a exibição de filmes inéditos. Já em São Paulo, denunciava a segregação: “– E um cinema, lá do lados do Arouche que não tolerava o ingresso do irmão negro?” (A Voz da Raça, 12.ª ed.1933)
Será que a Frente teve notícias dos Race Movies dos EUA? Um ciclo no qual pessoas de cor tiveram seus espaços de exibição e filmes, protagonizados por Oscar Micheaux.
No Brasil comprar um projetor era algo factível, e até fazer filmes não era algo tão caro, se fazia por hobby ou financiamento do poder público ou empresarial no modelo de cavação.
Só que a presença negra na renascente indústria nacional é pequena, porém significativa, como Cajado Filho, o “pai das chanchadas”.
O Cantor de Jazz (GROSLAND, 1927) é o primeiro filme falado da história, com estreia em Salvador no Cine Glória em 1930. No roteiro um judeu pobre tenta a sorte como cantor, pintando o rosto de preto.
Outro sucesso foi Imitação da Vida (STHAL, 1939), o qual uma mulher enfrenta a rejeição da filha de pele clara, e a tentativa de roubo das suas famosas receitas de panquecas por uma sócia branca.
Na época eram comuns os blackfaces e papéis subservientes ou violentos que afetavam homens e mulheres negras nas comédias, musicais, horror ou romances, aventuras….
A violências de muitas dessas obras fez com que a Associação Nacional para o Avanço das Pessoas de Cor (NAACP) firma-se um acordo com Hollywood em 1942 a fim de modificar os roteiros.
A perseguição aos batuques e trabalhadores é driblada pelo estivador Vavá Madeira. Ele assistiu Gunga Din (STEVENS, 1939): uma propaganda do império britânico que dominava Índia.
Mas ao sair do Cine Guarany, Vavá resolveu criar o Afoxé Filhos de Gandhi em homenagem ao líder pacifista na descolonização deste país, misturando nos tecidos e adereços o branco de Oxalá e o azul de Ogum.
Uma lógica se ressignificação também utilizada nos anos seguintes pelo Mercadores e Cavaleiros de Bagdá, dois blocos que transformaram os árabes, tratados como violentos nos filmes, em ícones da alegria nas ruas.
A saturação dos cortiços no centro insufla novos territórios permeados por cinemas, como o Cine Liberdade inaugurado em 1937, no mesmo ano da grande invasão na vizinha Corta Braço (atual Pero Vaz).
Já na região portuária, nas cercanias da nascente feira popular de Água de Meninos, estavam o Cinema Calçada e o Cine São Joaquim, esse um espaço de madeira improvisado, semelhante a um circo, onde era possível assistir as fitas depois de exibidas nas salas de primeira linha.
Já na Penísula de Itapagipe se concentra outro polo de salas na cidade, como o Cine Popular, Cinema Bonfim e o Cinema Itapagipe.
“O que é que baiana tem?” de Dorival Caymmi entra na chanchada Banana da Terra (1939) em substituição à trilha de Ary Barroso, pois esse recusou o contrato que utilizaria canções como “Boneca de Piche”, a qual Carmem Miranda interpretaria uma nega maluca.
Mas o blackface-lusotropicalista de Miranda resultou em 15 filmes hollywoodianos que a tornaram a vedete da “Política de Boa Vizinhança” dos EUA na América Latina.
Um prestígio que a fez, devido limites contratuais, colocar a sua irmã, Aurora Miranda, para encenar a animação de Walt Disney Você já foi à Bahia (1944), estrelada pelo Pato Donald e o amigo Zé Carioca, cercados em Salvador por músicos e dançarinos brancos.
O teatro São João foi inaugurado em 1812 com capacidade na casa de 2 mil pessoas. No seu palco tinham desde cerimônias oficiais até os lascivos lundus sob constante administração privada. No ano de 1881 o seu Largo passou-se a chamar Praça Castro Alves.
Na década de 1910 a ampliação da energia elétrica o integra ao crescente mercado de cinematographos ao seu redor, como o Cinema Bahia, na rua Chile; o Central na mesma Praça; e o Ideal no São Bento.
Um mercado atraente para um grupo de capital e catálogo de filmes dos EUA, a Companhia Cinematográfica Brasileira, ingressar em 1912 na administração de salas.
Díomedes Gramacho já era um gráfico de sucesso com a revista Renascença quando adquiriu a Lindheman Fotografia, situada no Largo do Teatro, em sociedade com José Dias da Costa.
No período conhecido como Bela Época do cinema brasileiro investiram em documentários como Regata de Itapagipe (1910), Carnaval da Bahia (1911), Segunda-feira no Bonfim (–), e N.S dos Navegantes (–).
A dúvida é se ocorreu o mesmo embranquecimento conforme se praticava nas produções do Rio de Janeiro e São Paulo, ou se filmar as africanias já era uma tendência por aqui.
José do Patrocínio Filho, o Zeca, foi o roteirista de Paz e Amor (1910), um marco da revista, o primeiro gênero da cinematografia nacional. É possível que tenha sido homenageado em Salvador, pois o Cinema Olympia, na Baixa dos Sapateiros, chamou-se por um período de Paz e Amor (1913-14).
Mais ainda, o seu nome continua a arrebatar multidões, tanto que em 1926 aproveitou a passagem no estado como redator para promover uma turnê de conferências sempre lotadas nos cines teatros de Salvador e do interior, como fizera seu pai no Teatro São João.
Nem por isso escapou trajetória da tentativo de assassinato de reputação a qual o pai sofreu, tanto que a sua biografia o marca por condutas imorais, e a sua identidade racial só aparece para ser mencionado como “cor de azeitona” ou quando o racismo o persegue na Europa.
Nas cercanias da Praça Castro Alves está a Igreja da Barroquinha, onde ao fundo surgiu no fim do séc. XVIII o terreiro da Casa Branca, até refugiar-se no fim do séc. XIX na atual av. Vasco da Gama.
Mas a região continuou a ser ocupada pelo povo de axé.
A cerca de 300 metros da Praça, Mãe Aninha (1869-1938), fundadora do Ilê Axé Òpó Afonjá, foi feita para Xangô, além de residir na Ladeira da Praça e no Largo do Pelourinho. No seu velório, Édison Carneiro e Mestre Didi registram: “…mais de duas mil pessoas compareceram e acompanharam, a pé, o cortejo, até as Quintas; o comércio e as das imediações da Igreja do Rosário, no Taboão e na Baixa dos Sapateiros, cerrou suas portas em homenagem…” cf. p. 63. LIMA, V. D. C (1987)
Já a Yalorixá Mãe Menininha do Gantois (1894-1986) nasce na Rua da Ajuda, e na vida adulta vai residir no Largo do Pelourinho, ainda mais perto dos cinemas da Baixa dos Sapateiros, como os opulentos Jandaia e o Pax.
Melindrosa era apelido às mulheres que seguiam a moda das star system hollywoodianas.
As vedetes populares no cinema eram brancas, mas a inspiração era as Black Flappers que surgiram no meio artístico do The Harlem Renaissance.
O teatro Polytheama Bahiano com Capacidade para 1900 espectadores segregados desde camarotes às gerais é o palco das homenagens às tropas de Canudos após findar o massacre em outubro de 1897.
Logo depois, no dia 4 de dezembro abriu ao público a primeira sessão de projeção coletiva de imagens em movimento que tornaria-se conhecida pela patente mais usual: o cinematographo.
Espalha-se nos grandes teatros, velhos casarões ou lonas de circos, permeados por cenas de Londres, Paris ou Nova York, por vezes em sessões de cunho educativo com isenção de impostos nas instituições católicas ou fundações culturais, como o Liceu de Artes e Ofício.
O “Ciclo Baiano de Cinema” é o curto e intenso período entre 1959 e 1965, quando a fixação por filmar na Bahia se soma a um conjunto de críticos e realizadores locais, que viria a confluir com o Cinema Novo.
Essa metodologia considera cinco filmes encenados por Pitanga: Bahia de Todos os Santos (TIGUEIRINHO NETO, 1960), Barravento (ROCHA, 1959), A Grande Feira (PIRES, 1961), O Pagador de Promessas (DUARTE, 1962) e Sol Sobre a Lama (1963), além de outros, como Redenção (SANTOS, 1959), Tocaia no Asfalto (SANTOS, 1962), e Deus e o Diabo na Terra do Sol (ROCHA, 1963).
Sem o apoio que desejava, ele deu prosseguimento ao sonho, tornando o Clube de Cinema um espaço que ampliou o acesso e a interpretação em relação às obras originárias de países como Rússia, Itália, França e Japão, formando sua própria escola, a Escola Baiana de Cinema, termo definido por Setaro (2010) para identificar um grupo de cineastas locais influenciados por Walter e liderados na produção por Glauber Rocha, Rex Schindler e Roberto Pires em três longas articulados: Barravento, A Grande Feira e Tocaia do Asfalto.
Estas também são obras que costumam ser legitimadas ao empregarem profissionais locais em funções artísticas como elenco e roteiro e ao terem um compromisso identitário que, no caso da Escola, há em “função da cultura local, o registro da baianidade numa perspectiva de imprimir no celuloide o “espírito de brasilidade”, via Bahia, sua terra e seu povo” (SETARO, 2010, p. 47). Porém, nem sempre narrativas feitas em um local trazem essa perspectiva de construção de identidade local, como foram Redenção (1959) e Tocaia no Asfalto (1962). Ambos são thrillers policiais, sendo o Redenção o primeiro longa-metragem de ficção dirigido e produzido por baianos88, critérios adotados das políticas do audiovisual, justificadas juridicamente no domicílio das pessoas ou empresas que controlam os direitos autorais, na direção e/ou na produção para destinar recursos de caráter estadual ou regional. Nessa época, os órgãos públicos cederam estrutura para locações em quase três anos de filmagem, sob a liderança do diretor Roberto Pires89, que obteve o grosso dos recursos da produção via financiamento de familiares.
Redenção também é precursor de uma noção de regional indiferente a um projeto identitário de baianidade, às pessoas negras e às culturas negras, o que, se por um lado, evita a expropriação, por outro, flerta com a negação visual e autoral corriqueira no cinema e na televisão nacional, uma indiferença pontuada por Walter Silveira como uma fraqueza narrativa:
Até porque, afora o fato de ser Redenção um filme com capitais baianos, escrito e dirigido por um baiano, interpretado por baianos, a presença da Bahia é uma simples presença de paisagem. E, num certo momento, desfigurada geograficamente… (SILVEIRA, 1959)
Fica então uma pergunta no ar: como a igreja católica principal grupo exibidor na cidade, e as empresas estadunidenses que controlavam o ramo a partir da distribuição, pensaram na possibilidade de repetir no Brasil algo parecido ao que aconteceu nos EUA, o ciclo do race movies?
Lá a segregação explícita no Sul e velada no Norte, impulsionou ter o controle de salas e na produção de filmes, liderados por Oscar Micheaux.